E o que é essa tal "Felicidade"
(Roberto Shiniashik)
Em l986 minha vida funcionava muito bem. Tinha conquistado tudo o que
havia imaginado que me tornaria feliz, mas vivia frustrado. Ficava me
perguntando se a vida era só isso. Uma coletânea de filmes, de
momentos...
Deveria haver algo mais, e assim decidi ir para o
Oriente, conversar com os mestres e saber o que eles pensavam a respeito
da felicidade. Fui para o Nepal, mais exatamente para Katmandu, a um
mosteiro budista, para descobrir o segredo da felicidade.
Encontrei
um hotel e fui procurar o mosteiro. A pessoa da portaria que me atendeu
disse que o mestre iria me receber na manhã seguinte às nove da manhã.
Saí de madrugada do hotel, na esperança de o mestre estar disponível e
poder conversar comigo mais cedo. Fiquei lá esperando até que ao redor
das nove horas, uma mulher falando inglês com sotaque de francesa entrou
na sala. Exultei imaginando que ela me levaria até o mestre. Ela me
acompanhou até uma sala, estendeu uma almofada para eu me sentar e
sentou-se à minha frente. A francesa era uma jovem morena, muito bonita e
eu lhe disse:
-Quero falar com o mestre!
Ela me respondeu:
-Eu sou o mestre.
Naquele momento, certamente não consegui esconder minha frustração e
pensei: puxa vida, viajei tanto tempo para chegar aqui e conversar com
um mestre de verdade e me mandam uma mestra francesa. Sacanagem! Todo
mundo tem um mestre homem, velhinho, oriental, de barba. Não uma mulher
jovem, bonita, e ainda por cima francesa! Eu falei para ela:
-Você não entendeu direito: quero falar com o mestre.
Ela me respondeu:
-Eu sou o mestre.
Aí pensei: vou fazer uma pergunta muito difícil para que ela não saiba a
resposta e tenha que me levar até o mestre de verdade. Fiz uma
pergunta, a mais difícil que pude pensar naquela hora:
-O que é budismo? E ela me respondeu tranqüilamente:
-A base do budismo é que todo ser humano sofre.
Pensei comigo mesmo: não é possível, eu saio da nossa cultura ocidental
que diz que o sofrimento é a base da purificação e da sabedoria, e
venho para cá para escutar que a base do budismo é o sofrimento! Não
satisfeito pensei: vou fazer uma pergunta mais difícil para que ela não
saiba a resposta e me leve até o verdadeiro mestre.
- E por que os seres humanos sofrem?
- Porque são ignorantes.
Bem, se somos ignorantes, deve haver alguma coisa que não sabemos e que, talvez, seja a resposta que estou procurando.
- E qual é o conhecimento que nos falta?
- O conhecimento que nos falta é a compreensão de que as coisas na
nossa vida são dinâmicas e fluidas. Quando o ser humano está feliz, ele
bloqueia a felicidade, pois quer a eternidade para aquele momento. Então
ele fica rígido, com medo do fim do prazer. Quando está infeliz, pensa
que o sofrimento não vai terminar nunca, mergulha na sombra e assim
amplia a sua dor.
A vida é tão dinâmica quanto as ondas do mar. É
tão certa a subida quanto a descida. Cada momento tem sua beleza. No
prazer nos expandimos e na dor evoluímos. Um movimento é complementar ao
outro. Saber apreciar a alegria e a dor na sua vida é a base da
felicidade. Você não pode ser feliz somente quando tem prazer, pois
perderá o maior aprendizado da existência.
Você deve descobrir um
jeito de ser feliz na experiência dolorosa, porque essa experiência
carrega dentro dela oportunidade de muito aprendizado. Não curta somente
o sol, aproveite também a lua. Não curta somente a calmaria, aproveite a
tempestade. Tudo isso enriquece a vida. Ela não pode ser vivida somente
dentro de uma casa, a vida tem que ser experimentada dentro do
universo.
A felicidade é um jeito de viver, é uma postura de vida, é
uma maneira de estar agradecido a tudo, não somente ao sol mas também à
lua, não somente a quem lhe estende a mão, mas também a quem o
abandona, pois certamente nesse abandono existe a possibilidade de
descobrir a força que existe dentro de você.
A felicidade não é o
que você tem, mas o que você faz com isso. Por isso existem pessoas que
têm muitos bens materiais, um grande amor, filhos lindos e, apesar
disso, se sentem angustiadas e depressivas.
Apaixonado por aquela mulher à minha frente somente consegui balbuciar antes de sair:
- Obrigado, mestra! (Por pouco meu preconceito a respeito do sexo e do
mestre me afasta dessa lição de vida). A felicidade não é o que acontece
em sua vida, mas como você elabora esse episódio. A diferença entre a
sabedoria e o desespero, o sábio e o desesperado, é que o sábio sabe
aproveitar as suas dificuldades para evoluir e o desesperado sente-se
vítima dos seus problemas. A felicidade é uma experiência que está
diretamente ligada à sabedoria e, certamente, para criarmos um planeta
mais feliz, precisamos muito mais de sábio do que de gênios. As pessoas
procuram sucessos em bens materiais, mas na verdade o único sucesso que
vale a pena é ser feliz!
postado por Maria de Fátima Vettoraci de Medeiros
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