by José Batista de Carvalho
Fui absolutamente rendida pelo poder das relações virtuais. Acredito que é possível conhecer alguém por e-mail, se apaixonar
por e-mail, odiar por e-mail, tudo isso sem jamais ter visto a pessoa.
As palavras escritas no computador podem muito. Mas nem sempre enxergam a
verdade.
São sete horas de uma manhã chuvosa. Você não dormiu bem à noite. Põe pra tocar um som instrumental que deixa suas emoções à flor da pele.
Vai para o computador e começa a escrever para alguém especial as
coisas mais íntimas que lhe passam no coração. Chora. Escreve. Olha para
a chuva. Escreve mais um pouco. Envia.
São
onze horas da noite deste mesmo dia. O destinatário da sua mensagem
está dando uma festa. Todo mundo fala alto, ri muito, rola a maior
sonzeira. Ele pega uma cerveja e dá uma escapada até o computador. Abre o
correio. Está lá a mensagem. Um texto longo que ele lê com pressa.
Destaca algumas palavras: "a saudade é tanta... sozinha demais... dividir o que sinto..." Papo brabo. Responderá amanhã. Deleta.
Alguém pode escrever com raiva,
escrever com dor, escrever com ironia, escrever com dificuldade,
escrever debochando, escrever apressado, escrever na obrigação, escrever
com segundas intenções. Nada disso chegará no outro lado da tela: a
pressa, a hesitação, a tristeza. As palavras chegarão desacompanhadas.
Será preciso confiar no talento do remetente em passar emoção junto de
cada frase. Como pouquíssimas pessoas têm esse dom, uma mensagem
sensível poderá ser confundida com secura, tudo porque faltou um par de
olhos, faltou um tom de voz.
Se
você passou a desprezar alguém, pode escrever "não quero mais te ver".
Se você ama muito alguém, mas a falta de sintonia lhe vem machucando,
pode escrever "não quero mais te ver".
Uma
mesma frase e duas mensagens diferentes. Palavras são apenas resumos
dos nossos sentimentos profundos, sentimentos que para serem explanados
precisam mais do que um sujeito, um verbo e um predicado. Precisam de toque, visão, audição. Amor virtual é legal, mas o teclado ainda não dá conta de certas sutilezas.
Martha Medeiros
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