Há vários anos, em Seattle, Washington,
vivia um refugiado tibetano de 52 anos de idade. “Tenzin” era portador
de um linfoma fácil de curar. Ele foi internado e começou a
quimioterapia. Mas, durante o tratamento, este homem normalmente gentil,
tornou-se agressivo e irritado; arrancou a agulha intravenosa de seu
braço e negou-se a cooperar. Gritou com as enfermeiras, discutiu com
todos. Os médicos e enfermeiros ficaram desconcertados. Depois, a esposa
de Tenzin falou com o pessoal do hospital. Ela contou que Tenzin foi um
prisioneiro político dos chineses por 17 anos. Eles mataram sua
primeira esposa e ele foi repetidamente torturado e brutalizado durante
todo o tempo em que esteve preso. As normas e regulamentos do hospital,
juntamente com a quimioterapia, fez Tenzin recordar todo o sofrimento
que passou nas mãos dos chineses. Eu sei que vocês querem ajudá-lo, ela
disse, mas ele se sente torturado pelo tratamento. Ele faz com que ele
sinta ódio internamente – da mesma maneira que os chineses fizeram ele
sentir.
Ele prefere morrer do que viver com o ódio.
Segundo nossas crenças, é muito ruim ter ódio no coração na hora da
morte. Ele precisa estar apto para rezar e limpar seu coração. Assim, o
médico dispensou Tenzin e recomendou uma equipe da clínica de repouso
para visitá-lo em casa. Eu era a enfermeira encarregada de cuidar dele.
Entrei em contato com um representante da “Anistia Internacional” para
pedir-lhe conselhos. Ele me disse que a única forma de sanar o trauma da
tortura era falar a respeito. Esse paciente perdeu a confiança na
humanidade e sente que a esperança é impossível. Mas quando eu encoragei
Tenzin a falar sobre suas experiências, ele ergueu suas mãos e me fez
parar. Ele disse: Eu preciso aprender a amar de novo se eu quiser curar
minha alma. Sua tarefa não é fazer perguntas e sim me ensinar a amar
novamente. Respirei profundamente e perguntei: E como eu posso fazê-lo
amar de novo? Tenzin respondeu prontamente: Sente-se, tome meu chá e
coma meus biscoitos. O chá tibetano é um chá preto forte, coberto com
manteiga de iaque e sal. Não é fácil de bebê-lo! Mas, foi o que eu fiz.
Por várias semanas, Tenzin, sua mulher e eu nos sentamos juntos e
tomamos chá.
Conversei com os médicos para achar formas
de tratar suas dores físicas, mas era sua dor espiritual que deveria ser
diminuída. Cada vez que eu chegava, via Tenzin sentado de pernas
cruzadas em sua cama, recitando preces de seus livros. Na chegada da
primavera, eu perguntei o que os tibetanos faziam quando estavam doentes
na primavera. Ele abriu um grande sorriso e disse: Nós nos sentamos e
aspiramos o vento que sopra pelas flores. Eu pensei que ele estava
falando poeticamente, mas suas palavras eram literais. Ele explicou que
os tibetanos fazem isso para serem pulverizados com o pólen das novas
floradas, carregadas pela brisa. Eles acreditam que esse pólen é um
potente medicamento. No primeiro momento, achar muitas floradas parecia
um pouco difícil. Mas, um amigo sugeriu que Tenzin visitasse algumas
floriculturas locais. Eu liguei para o gerente de uma floricultura e
expliquei-lhe a situação. Sua reação inicial foi: Você quer o quê??? Mas
quando eu expliquei melhor o meu pedido, ele concordou. Então, no final
de semana seguinte, eu busquei Tenzin, sua esposa e suas provisões para
a tarde: chá preto, manteiga, sal, chícaras, biscoitos, almofadas e
livros de preces. Eu os deixei na floricultura e combinei de pegá-los às
17 horas. No outro final de semana, visitamos uma outra floricultura. E
mais outra no terceiro fim de semana.
Na quarta semana, eu comecei a receber
convites das floriculturas para Tenzin e sua mulher para voltarem
novamente. Um dos gerentes disse: Nós temos uma nova remessa de
nicotianas e lindas fuchsias… ah, sim! E temos belas dafnias. Eu sei que
eles vão adorar o perfume das dafnias! E eu quase me esqueci! Temos uns
novos bancos de jardim que Tenzin e sua esposa vão adorar! No mesmo
dia, outra floricultura ligou dizendo que eles tinham recebido birutas
coloridas para Tenzin saber de que direção o vento estava soprando.
Logo, as floriculturas estavam competindo pelas visitas de Tenzin. As
pessoas começaram a se importar com o casal tibetano. Os empregados
arrumavam os móveis de frente para o vento. Outros traziam água quente
para o chá. Alguns fregueses regulares deixavam seus carrinhos de
compras próximos do casal. E no final do verão, Tenzin voltou ao seu
médico para novos exames e determinar o desenvolvimento da doença. Mas o
doutor não achou nenhuma evidência de câncer. Ele estava abobalhado;
disse a Tenzin que ele simplesmente não sabia explicar aquilo.
Tenzin
levantou seu dedo e disse: Eu sei porque o câncer se foi. Ele não podia
mais viver num corpo tão cheio de amor. Quando eu comecei a sentir a
compaixão das pessoas da clínica, dos empregados das floriculturas, e
todas essas pessoas que queriam saber de mim, eu comecei a mudar por
dentro. Agora, eu me sinto afortunado por ter a oportunidade de ser
curado dessa forma. Doutor, por favor, não acredite que a sua medicina é
a única cura. A compaixão pode também curar um câncer. (Uma História
Tibetana De Cura por Lee Paton em 11/05/2001)
A Compaixão é a chave indispensável para
abrir todas as portas, mas os seres humanos a perderam há muito tempo!
Ter compaixão não é afundar junto com o outro, porém, amá-lo o
suficiente para saber o que ele sente, sem tentar julgar e nem precisar
entender. Compreender o outro é sentir o que ele sente sem misturar suas
emoções com as nossas. Para praticar a compaixão, os essênios
“respiravam” no ritmo do ser que sofre, pois, sabiam que poderiam, dessa
forma, pouco a pouco, identificar-se com ele e, sem adquirir o seu mal,
vivê-lo interiormente. Jesus curava através da compaixão. Ele, sem que
as pessoas percebessem fazia com que suas vidas retrocedessem curando os
episódios traumatizantes. Os seres humanos gravam na memória celular os
acontecimentos dolorosos e esses passam a dominar seus corações.
Depende de nós termos consciência das situações que necessitam de nossa
atenção e curá-las. Nossa mente só atua de forma curativa, quando
mudamos nossas percepções. Não se consegue ensinar aquilo que não
acreditamos ou não praticamos; assim, a melhor forma é amor, é perdão e
perdão é compaixão.
Muita coisa em nossa vida só curamos pelo
poder da compaixão alheia. Psicólogos e psiquiatras curam até certo
ponto, trazendo à consciência pontos fracos e vulneráveis, porém só a
compaixão, o perdão e o amor removem as cicatrizes e penetram nossas
sombras, curando as recordações dolorosas do passado. Uma pessoa
sofrida, depressiva, precisa acreditar que a vida vale a pena, que
existem homens com valores humanos suficientes para lhes dar motivação.
Não existem tratamentos que ajudem a pessoa a superar seu estado, quando
ela entra numa situação difícil do passado, sem um acolhimento
carinhoso. Quando tratamos o outro com compaixão, sentimos uma calma que
não pode ser atrapalhada, aquecemos nosso coração, sentimos um conforto
profundo e um descanso tão perfeito que nunca poderão ser perturbados.
VERA GODOY
postado em "Portal Arco Iris"
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