importância, comparado com o que está
dentro de nós”.
Oliver Holmes
Clara nunca tinha visto um lugar assim, tão bonito e florido. Havia
flores por todos os lados. A maioria
eram cor de rosa, mas muitas passavam por todos os matizes do rosa até o vermelho. Parecia um
grande jardim sem fim. Seu vestido cor rosa-pêssego e tecido muito leve, como
uma espécie de seda ou crepe, ia até os pés. Caminhava por entre as alamedas de
flores, como se estivesse flutuando,
quase sem tocar o chão. Logo estava no
bosque, correndo entre as árvores que já conhecia bem. Dirigiu-se para o lugar
que mais gostava, a clareira da
araucária. Uma surpresa a aguardava.
Ao redor da clareira brincavam
pequeninos seres. Eram muitos e de
aparência estranha. Vestiam roupas esquisitas, lembrando os anões da Branca de
Neve. Formavam um grande círculo que ocupava toda a clareira e alguns tocavam
flauta alegremente. Aliás, na verdade,
todos demonstravam estar muito, muito alegres. Clara estava como que
hipnotizada com o que via. Apesar de esquisitos, os homenzinhos não pareciam
oferecer qualquer risco, e ela foi se aproximando devagarinho, tentando não a chamar atenção deles. Foi inútil o seu
cuidado. Logo se viu puxada para dentro do círculo e obrigada a brincar e
dançar com eles.
Sentia-se como uma criança...absolutamente livre. Corria, pulava, não havia qualquer
diferença no comportamento dela e daqueles seres. De repente um deles começou a catar pequenos
arbustos, pedacinhos de troncos ou galhos caídos pelo chão. Alguns o imitaram e
logo havia no centro do espaço um bom monte de lenha. Então o que parecia ser
mais velho e líder do grupo se aproximou, e com alguma coisa que tinha na mão,
acendeu uma pequena fogueira. Depois levou uma espécie de flauta à boca,
emitindo um som estranho, e imediatamente os outros que estavam mais distantes,
brincando, vieram como se atendessem a um chamado.
Todos estavam agora, sentados em círculo, ao redor da fogueira. De
repente, levaram as pequenas mãos à testa, à cabeça e ao peito e depois se curvaram diante da fogueira dizendo
todos a uma só voz: “Salve as Salamandras.
Salve o poder do fogo!”
Clara estava em pé, a um canto,
observando tudo aquilo, como se participasse de
um filme de Walt Disney. Ela sentia que aquilo era um ritual importante.
Não sabia porque, mas que era um ritual, era. Isso tinha certeza. Como se uma vozinha interna a avisasse
que precisava ficar bem quieta, não podia incomodar. Aquele mundo não era o dela, apenas lhe era
dado o direito de conhecê-lo, mas não podia interferir de maneira alguma.
Parece até que esqueceram sua presença ali. Em um
determinado momento, o que parecia dirigir o grupo foi até o centro
levantou uma das mãos e todos ficaram em absoluto silêncio. Então ele começou a
falar e Clara pode compreender o que dizia.
Falou da terra e da natureza,
lembrando que era necessário continuar a obra.
Nesse ponto Clara se perguntou a que obra ele estaria se referindo.
Ele dirigiu o olhar para os que pareciam
ser mais brincalhões, e continuou falando. Disse que eles tinham uma grande responsabilidade,
que cada um precisava desempenhar a sua
tarefa, fazer a sua parte.
- Os que ficaram incumbidos de catar as sementes e enterrá-las, não
podem relaxar nas sua responsabilidade.
Os pássaros fazem a sua parte, espalham sementes por toda a parte. Mas
de que adianta se nós não a enterramos e cuidamos até que elas possam sozinhas, prosseguir na sua
missão? Nós sabemos bem que muitas
sementes caem sobre pedras e outras em lugares onde não haveria a mínima
condição de brotar e crescer. Concordam que isto é uma função nossa?
Todos pareciam compreender e aceitar o papel que lhes cabia. Eles
olharam para o que parecia ser o seu mestre, com respeito e amor. Sabiam que
era seu o trabalho cuidar da natureza e levar a vida na terra adiante. O tempo
passou e eles lá falando e ela ouvindo. Ao final de algum tempo, o mestre -
vamos chamar assim -, levantou mais uma vez a mão e todos se levantaram e
saíram correndo para a brincadeira.
Dois deles se aproximaram de Clara e dando-lhes as mãos, a convidaram a
brincar de roda. Pareciam flutuar, dançando enquanto alguns tocavam as
flautas. Nem percebeu que haviam se afastado de perto da
fogueira e estavam agora ao lado do córrego que passa ali perto. Ela já fora até
lá, algumas vezes, em busca da água limpa e fresca, nas suas caminhadas pela
floresta. Mas....agora não parecia o mesmo lugar. Seres parecidos com a s fadas dos livros de
história, voavam por toda parte.
- Que lindas! Nem acredito que
isto existe. Parecem fazer parte da própria água. Algumas chegam a ter asas.
Que lindas elas são! Lindas, lindas, lindas, não parava de falar para si
mesma. Estava atônita. Mais surpresa do
que ficou ao ver os anõesinhos.
- São elas que cuidam da umidade da terra. Sem elas não haveria vida na Terra, a
natureza não pode existir sem a água. Os homens não percebem que estão
destruindo a si mesmos quando jogam tanto lixo nos rios, nos mares....
Clara se voltou para ver de onde vinha a voz e viu aquele que parecia
ser mestre dos homenzinhos perto de onde estava. Olhando assim, mais de perto,
pode perceber o olhar de sabedoria que mostrava enquanto falava. Reparou que
ele tinha um chapéu de pano na cabeça e nos pés calçava velhas botas de cano
alto. Era uma figura estranha, mas sem dúvida alguma, impunha um certo
respeito.
A Terra está pedindo socorro. – continuou a falar o pequeno ser - , se
os humanos continuarem voltados apenas para a ambição e ganância, não dando
ouvidos ao apelo que a Terra diariamente faz, não podemos garantir vida por
muito tempo.
- Veja à sua volta. Esta
floresta é a própria manifestação da vida.
Outras pelo mundo a fora garantem o oxigênio que o homem precisa para
viver. E o que fazem os
gananciosos? Cortam as árvores para
vender a madeira, querem fazer fortunas à custa da própria vida. Bem, isso você
já sabe. Desculpe, menina, mas não me
contenho diante do que os homens fazem à natureza. Na verdade, nós elementais,
construímos, e o homem destrói.
Clara não conseguia falar, apenas ouvia. Mas compreendia perfeitamente.
Tentou se comunicar mentalmente.
Dizer-lhe que compreendia e concordava com o que ele dizia. Esperou e a
resposta do homenzinho foi um sorriso. Logo ele continuou:
- Cada um dos elementos da natureza tem a sua função específica na
construção da vida na Terra. Sejam as
Ondinas, elementais da água, as
Salamandras, os elementais do fogo ou as fadas e silfos que vivem no ar.
Todos têm uma tarefa importante na manutenção das condições adequadas para o
homem viver aqui no Planeta. Sem falar de nós, os gnomos, que somos os elementos da terra e trabalhamos
arduamente para que a humanidade possa continuar por aqui enquanto precisar
deste plano para sua evolução. Cada um deve fazer a sua parte. Nós procuramos
realizar nossas tarefas da melhor maneira possível. Estamos certos disso!
- Você, menina, também tem a sua tarefa! A vida também se manifesta
através de você! É também sua
responsabilidade cuidar da vida que se manifesta em toda a parte. Em você e em tudo que a cerca. Você sabe qual
é a parte que lhe cabe na criação, na grande obra? Pense sobre isso e lembre-se: Cada criatura
tem uma missão na vida. Qual é a sua
missão? Para fazer bem a parte que lhe
cabe fazer, você precisa saber qual é a
sua missão. Qual é a sua missão?
Qual é a sua missão? Qual é a sua missão?
Clara deu um pulo na cama.
Acordou assustada ouvindo a pergunta ressoar na cabeça e mais que isso, ecoando por todo o
corpo.
Tomou um pouco de água e olhou o
relógio. Ainda era de madrugada, muito
cedo para levantar. Vestiu um robe sobre
o pijama e foi até a janela. A lua crescente, iluminava todo o céu, tornando a
noite especialmente bonita. Ficou alguns minutos observando a rua deserta
enquanto pensava no sonho.
Estranhamente, lembrava
perfeitamente de cada detalhe. As imagens estavam claras e nítidas, continuavam
ali, na tela mental, como se tudo estivesse acontecendo agora, neste momento.
- Que sonho incrível. Não,
não foi um sonho. Não pode ter sido. Era tudo muito real, acontecendo
ali na minha frente. Meu Deus, o que está acontecendo comigo? O que significa esse sonho? Dizem que
os sonhos são mensagens do inconsciente tentando nos mostrar algo. Mas o que o
inconsciente pode querer me mostrar? O que precisa tornar-se consciente?
Como
sempre que está assim, aflita, passa as mãos pelo rosto, mostrando sua confusão
interior.
- Não sei mais o que pensar!
Minha missão não é atender meus pacientes? Foi a profissão que escolhi! E procuro fazer
o melhor dentro das limitações.
Voltou para a cama, ainda tentando encontrar explicações. Precisava
de respostas. Diante dela passaram mil vezes as figuras
estranhas que povoaram o sonho. Lembrava as palavras que ouviu, o tom de
voz....tudo.
-
Qual é a sua missão?
A voz do chefe dos homenzinhos continuava dentro dela com a mesma pergunta.: - Qual é a sua missão?
E Clara adormeceu perguntando a si mesma, como fazer para saber qual a
sua missão na vida.
Durante toda a semana, não houve
um único dia em que Clara não se fizesse a
mesma pergunta. Na verdade, era o primeiro pensamento que vinha tomava conta
dela pela manhã. Já na segunda-feira,
quando acordou, ela lembrou do
sonho, e
logo aquela vozinha se fez ouvir como se pedisse uma resposta.
Por mais que tentasse esquecer o assunto, bastava ficar distraída e aquelas imagens estranhas surgiam de novo
diante dela. Engraçado... Gostava de lembrar dos homenzinhos. Sentia como se fossem seus amigos.
- Aquele que parecia ser mestre dos outros, parecia ter muitos
conhecimentos.. Falou tanta coisa
interessante. Nada do que disse pode
ser considerado um absurdo. Tem até muita lógica. Mas... e essa história de
cada um ter uma missão? Que missão?
De resto, além de muito trabalho, os dias passaram sem nenhum
acontecimento que mereça destaque.
Finalmente chegou o Sábado. Logo cedo ligou para Lúcia. Estava ansiosa para saber se iriam se
encontrar, como João Carlos havia sugerido.
A amiga contou-lhe que a esposa
um cliente havia ligado pedindo ajuda
para seu marido que estava tendo uma
crise.
- Estou indo até lá para
acompanhar a situação de perto e não sei
a que horas estarei disponível para o nosso encontro. Mas ainda assim
,vou conversar com João Carlos e depois
ligo.
- Por favor, Lúcia, vê se dá um
jeitinho. É importante voltarmos a conversar. Esse assunto me interessa mais do
que você pode imaginar.
- Que é isso, minha amiga? Você parece muito ansiosa. Será que aconteceu alguma coisa que a está
incomodando? Parece aflita.
- Não se trata de aflição, mas estou ansiosa para ouvir vocês falarem
mais, quero também tirar algumas dúvidas.
- Olha, o João é a pessoa
indicada para esclarecer suas dúvidas. Está no caminho há bastantes anos, estuda muito e principalmente, é uma
pessoa muito séria, aliás, até demais. É de pouca conversa.... Sabe que estranhei o
modo dele na sua casa? Já o conheço há tempos e nunca o vi assim, tão à
vontade, tão falador. Você, com esse jeitinho tímido, o conquistou.
- Lúcia, nem fale assim, que fico sem jeito. Sabe muito bem que não
fico à vontade com quem não conheço
direito. Ele foi muito simpático, mas tenho certeza que essa história de
conquista é brincadeira sua, você está
brincando, não está?
- Calma, amiga, claro que estou brincando. Quando vai parar de ter medo
dos homens? Não estou falando de João, mas de outros que fazem de tudo para
chegar mais perto e você não abre espaço....conheço um monte que tenta se
aproximar e nada. Não está na hora de se
dar a chance de conhecer alguém legal?
- Que exagero! Ouvindo você
falar, parece que nunca namorei. Quantas vezes saímos juntas com nossos
namorados?
- Está bom! Você sabe que não é disso que estou falando, de
namoradinhos passageiros. Estou falando
de amor, filhinha, amor!
-
Mas e aí vai falar com ele e me dar retorno?
Era sempre assim. Quando o assunto era amor, Clara cortava a amiga,
mudava imediatamente a conversa. Lúcia nunca insistia.
Respeitava a privacidade da amiga e logo mudava de assunto. Acertaram que falariam mais tarde para
confirmar o encontro.
Depois do almoço o telefone tocou.
Atendeu ansiosa, devia ser a amiga para dar o retorno que esperava.
-
Clara? João Carlos!
-
Como está? Tudo bem?
- A Lúcia pediu que ligasse porque ela tinha um compromisso e já estava
saindo. Incomodo você?
Conversaram alguns minutos e marcaram o encontro para mais tarde na casa dela. Lúcia viria mais tarde, direto
do atendimento ao cliente.
- Faço questão de levar o lanche. O chá fica por sua conta. Está bem
para você?
Estava contente com a perspectiva da visita Gostava do jeito dele, parecia uma pessoa
confiável. Lembrou do modo franco
dele olhar. Essa é uma
característica que admira nas pessoas.
- É agradável conversar com alguém que nos olha nos olhos enquanto
fala. – pensou enquanto se preparava
para receber os amigos .
continua...
MCCA
Nenhum comentário:
Postar um comentário