Saint-Exupéry
Estava diante daquela gruta que conhecera, levada pelo Irmão. Subiu os
degraus compostos de pedra bruta e parou na entrada.
Não parecia ter ninguém ali. Deu alguns passos e olhou ao redor. Era
muito pequena e não tinha qualquer objeto. Estava escuro, apenas uma
leve penumbra que deixava Clara ver que no canto de uma parede, havia uma
porta, ou melhor, uma espécie de abertura. Mais nada.
Clara foi até a porta e viu que dava passagem para uma escada que
descia para algum lugar. A escada não
parecia ter muitos degraus e a pouca luminosidade era suficiente para descer
sem tropeçar. Ela ia ver o que
tinha lá embaixo. Não havia razão para ter medo. Já chegara até ali. O que
poderia acontecer se fosse adiante? Afinal era a gruta do Irmão. Que poderia
ter ali de assustador? Além disso ele provavelmente estava lá embaixo. Ela
queria tanto vê-lo! Ia descer, sim!
Mal havia descido alguns degraus, já podia avistar um longo corredor
embaixo. Ao chegar ao último degrau deparou-se com uma grande ametista. Estava
estrategicamente localizada entre a escada e o corredor. Aproximou-se da
ametista e a tocou. Sua mão atravessou a
pedra que parecia ser de um material permeável e gelatinoso. Esticou o braço e
logo todo corpo atravessava a ametista. Chegou ao corredor como se flutuasse.
Viu que haviam várias portas nos dois lados do corredor. Cada uma tinha uma plaquinha com um nome.
Parou diante de uma com seu nome. Clara!
Empurrou levemente a porta. Estava apenas encostada, fácil de abrir.
Entrou e mesmo na penumbra viu uma sala
vazia com vários quadros nas paredes.
Uma delas era totalmente ocupada por um imenso
espelho. Apenas isso e uma grande poltrona colocada no centro do espaço.
Mais nada.
Então ouviu aquela vozinha interior que já conhecia bem, dizendo que se
sentasse.
Obedeceu à voz e sentou. Voltou a atenção para os quadros das paredes. Eram retratos de homens e mulheres vestidos com roupas à moda
antiga, como personagens de filmes de época.
Ficou um tempo com os olhos fixos nas imagens das paredes diante dela.
Parecia que aquelas figuras a hipnotizavam. Não conseguia afastar os olhos
delas. Com esforço virou-se para ver o espelho. Mas elas também estavam lá.
Agora pareciam estar vivas, com se aquele espelho fosse uma tela onde
estavam sendo projetadas cenas de
situações muito estranhas. Não conseguia
compreender o que via. Nada parecia fazer sentido.
Via cenas de guerras, de mortes, crianças sendo arrancadas dos braços
da mãe. Mulheres desesperadas vendo seus homens partindo para não mais voltar
ou sendo assassinados ....Alguns homens poderosos que faziam uso desse
poder, dos modos mais estranhos; desde o
uso da violência sexual até assassinatos cruéis. Algumas mulheres que usavam a
sensualidade para obter vantagens....
Clara via as cenas se desenrolarem
naquela tela em que se transformara o grande espelho.
Estava impressionada e aflita por não entender o significado do que
via. Por mais que se esforçasse
continuava sem entender nada. Perguntava o que queria dizer aquilo que
estava sendo mostrado a ela. Mas nenhuma resposta. A aflição foi aumentando e
quando já era insuportável, acordou.
Meus Deus! O que é isso? Quem são essas pessoas? O que querem que eu
saiba?
Lembrou-se de uma mensagem que lera, “ Acredite que suas ações de hoje
vão determinar o futuro, bom ou mau. É a Lei de causa e efeito se
manifestando”.
Sabia que estava tendo acesso a informações do passado. Sentia isso.
Mais uma vez, atravessara o portal do Tempo. Eram cenas já vividas.
Seria a mente inconsciente
liberando imagens guardadas? E agora, ela estaria pronta para decifrar estas mensagens?
Provavelmente não. Apesar de sua sensibilidade, ainda não se via capaz de
compreender a voz do inconsciente. Qual daquelas figuras seria ela? Precisava
descobrir quem era ela em meio a tantos personagens que passaram por sua tela
mental....Sabia que tanto podia ser uma vítima quanto o algoz..
Talvez se fizesse uma terapia ou uma regressão ao passado, conseguisse
compreender. Pensaria nessa possibilidade.
Foi à cozinha fazer um chá.
Sentia-se mal. Parecia que a aflição que
viu na tela, a angústia do passado, veio com ela. Fez uma oração pedindo que o Mestre Jesus tirasse aquela
sensação de dentro dela. As imagens
passeavam por sua mente, não conseguia afastá-las.
Pensou na Luz Violeta e pediu aos Anjos Mensageiros que a iluminassem
com a Luz da transmutação. Começou a fazer um exercício respiratório e
imaginando uma luz violeta sobre a cabeça, mas não conseguia vê-la com clareza.
Estava tensa e continuava com as imagens
à sua frente. Resolveu concentra-se na respiração até que conseguiu diminuir o
ritmo respiratório, pouco a pouco. Percebeu que à medida que se acalmava, a luz
violeta ia tornando-se clara e bonita, brilhante. Dentro de alguns minutos a luz estava iluminando a
cabeça e descia pelos chacras coronário para a testa. Deixou que a luz limpasse
todas as imagens e afastasse as formas pensamentos que havia criado ao se
deparar com aquelas cenas. Depois imaginou a luz fluindo por todo corpo e viu quando descia pelo pescoço e
iluminava o peito, a cintura , o
abdomem, as coxas, as pernas e os pés.
Estava mergulhada numa bela aura de Luz. A sensação agora era de paz,
tranqüilidade, e harmonia.
Logo depois, Clara adormecia.
Acordou bem disposta e sentindo-se em equilíbrio. Enquanto se arrumava,
pensava no significado das cenas que vira na noite anterior. O seu coração lhe
dizia que recebera um grande oportunidade de crescer. De abrir-se para outras
verdades maiores. De algum modo, sabia
que o fato de poder ter acesso àquela porta, por si só já significava
estar sendo levada ao auto-conhecimento. Era tudo que ela mais queria:
Conhecer o seu passado. Acreditava que
dessa maneira poderia, ao menos,
tentar entender algumas coisas do
presente. Principalmente o medo de constituir a sua própria família. Isso era
algo que precisava compreender. Mas o que viu naquela sala não a ajudou nesse
sentido. Que significavam aquelas cenas?
No final da tarde, Clara ligou para Lúcia. Precisava conversar com ela sobre o cliente
que lhe mandara. Discutiram o diagnóstico e as possibilidades do paciente obter
resultados favoráveis com um trabalho energético.
- Talvez ele pudesse ir a algum lugar onde sejam aplicados passes magnéticos, o que
acha? Depois faria um tratamento com irradiação de energia de cura. Foi o que
pensei.
- Clara, minha amiga. Estou tão
feliz ouvindo você falar assim. Que bom
que você descobriu o valor da Medicina Vibracional. Conversei com ele e mostrei
que pelo menos neste momento, a psicoterapia não é o tratamento mais adequado,
para aliviar seus sintomas. Muito sutilmente sugeri que tentasse uma ajuda
espiritual, disse-lhe que em alguns casos o resultado obtido é bom.
-
E aí, aceitou a sugestão?
- Sabe o que ele me respondeu?
Que me procurou porque alguém lhe
indicou o meu nome como sendo de uma boa psicóloga. E era só isso que estava buscando, não procurando uma Espírita. Disse que é Cristão e a religião dele tem horror ao
Espiritismo. Levantou-se zangado e foi embora sem me deixar terminar de falar.
E aí, o que fazer nesses casos?
- Parece que não há nada a fazer. Ele fez a sua escolha. Simplesmente,
está fazendo uso do Livre Arbítrio. Ou não? Não podemos impor nossas crenças a
ninguém, ainda que seja para salvar a sua vida.
-
De qualquer modo, valeu a intenção.
Quando desligou, Clara ficou pensando nas pessoas que se negam receber
ajuda espiritual por questões religiosas
e em outras que deixam de procurar um médico por acreditar que essa ajuda
basta. São os extremos do fanatismo.
Sua mente não parava, os pensamentos iam e vinham. Lembrou-se das palavras de Marta e a previsão
que fizera. Que mudanças seriam essas que ela viu no Tarô? Bom, ela disse que
trariam alegria. Isso era bom.
E o Irmão? Era o seu Mestre, não tinha
dúvida.
Pensou mais uma vez em João
Carlos. Sempre que pensava nele, era o seu sorriso que via `a sua frente. E o
olhar direto, franco, bonito.
Começou a ficar apreensiva.
- O que é isso Clara? O que está pensando? Ele é teu amigo! Apenas
isso!
Lúcia tinha razão. Fugia de qualquer sentimento mais forte. Desde
criança dizia que nunca se casaria. Quando terminou a Faculdade a avó pensou
que logo a veria casada. Ela chegou a conhecer alguns colegas que não escondiam
o sentimento a respeito da sua neta. Mas
isso não fazia parte dos planos de Clara. Queria ser independente, continuar
fazendo o seu trabalho... casar não. Para que? Não queria casar por casar.
Estava bem assim. Dificilmente encontraria alguém que a compreendesse e
respeitasse, que fosse forte, mas romântico...alguém muito especial, aí sim,
quem sabe?
Passou as mãos pelo rosto. Não queria pensar nisso.
Mas pouco a pouco essa idéia passou a perturbá-la. De onde veio essa
certeza de não querer casar? Será que foi na infância, por ouvir os comentários
negativos da avó sobre o seu pai que a abandonou? Ou talvez a causa esteja em
fatos anteriores que não é capaz de lembrar?
O Irmão a ensinou a fazer a Chama Trina. Estava na hora de exercitar.
Começou a fazer a visualização como Ele lhe ensinara. Quando terminou, ficou
com os olhos fechados, quieta, absorvendo a energia que fluía no seu peito. A
luz rosa, azul e amarela a iluminavam.
O telefone chamou. Pensou em não atender, mas podia ser algum paciente
precisando dela.
-
Clara, João! Como está?
-
Oi, João. Está tudo ótimo.
- Pensei que talvez quisesse
conversar um pouco. Estou saindo, quer dar uma andada?
-
Agradeço João, mas estou tão cansada! Pensei em deitar cedo.
Conversaram alguns minutos e quando desligou, Clara se perguntou se não
fizera uma tremenda bobagem. Seria bom
poder vê-lo, conversar....Não, ela não
queria envolvimento ou uma intimidade maior. Passou a mão pelo rosto para
afastar as idéias que a perturbavam. Tinha muito a aprender.... pegou a
apostila e o Tarô e sentou-se para estudar.
No Sábado quem ligou foi Lúcia.
- Querida, estou tão contente!
Você está convidada para conhecer os trabalhos espirituais do grupo.
Pode ser amanhã?
-
Quem falou? João Carlos?
- Ele ligou para me propor
um trabalho na Empresa e perguntou sobre
você. Depois, como eu havia sugerido a sua entrada no grupo, ele achou que me
devia uma resposta. Mas não falou com você? O que está havendo?
- Nada que eu saiba. De repente não me localizou. Mas não há nada.
-
Nada mesmo? Tive a impressão que vocês haviam se tornado amigos. Ou aconteceu
alguma coisa que não posso saber?
-
Lúcia! O que poderia ter havido? Que idéia!
- Está bem, não precisa ficar zangada. Esquece o que disse. Olha que
tal fazer um curso comigo? Não é bem um curso, são vivências que promovem o
descobrimento de nossas potencialidades. Estou querendo fazer já há algum
tempo. Quer ir? Aproveita para descansar um pouco. Vamos!
-
Vou pensar e amanhã conversamos. Obrigada, amiga!
-
Tudo bem. Então nos vemos amanhã
Clara pegou o endereço e combinaram encontrar-se lá. Finalmente ia
conhecer os trabalhos que Lúcia fala tanto.
Já estava deitada quando João Carlos ligou. Convidou-a e disse que
Marta e ele estariam lá, esperando por ela. Falou
rapidamente, como se tivesse pressa.
Estranhou o tom de voz dele. Talvez tivesse ficado magoado com
ela. Não queria que isso acontecesse.
Estava perturbada com as emoções e sensações que desconhecia ser
capaz de sentir.
Nessa noite sua meditação foi mais longa. Precisou um tempo maior para
se conectar com o Plano Superior. O tom de voz de João Carlos mexeu com ela. A
todo instante isso vinha à sua mente. E se ele estivesse mesmo zangado? Mas ela
não havia feito nada mais, do que tentar
evitar problemas!
continua...
MCCA
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