sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Atravessando o Portal do Tempo IV

IV             “ Só é possível enxergar direito com o coração.
               O essencial é invisível para os olhos”.
                                             
                                                           Saint-Exupéry

Acordou bem cedo e com fome. Tomou um suco de frutas e comeu algumas torradas com geléia. Vestiu uma calça bem confortável e uma camisa amarela com um grande sol estampado num tom mais forte, quase laranja.  Colocou os tênis e saiu carregando uma pequena mochila às costas.
Começou a ficar  ansiosa. E se ele estiver lá?
- Seja o que Deus quiser. Será o que for melhor para mim.
Lembrou-se das palavras da avó. “Não tenha medo, filhinha, Deus mandou um anjinho só para cuidar de você,  só vai acontecer o que for melhor para minha menina”. Escutou essas palavras durante toda a infância. Foi ela que lhe ensinou tudo sobre Deus. Sua presença carinhosa amenizou a falta da mãe.
Sua mãe morreu quando ela nasceu.  Tinha problemas de saúde e não suportou  o esforço do parto. Cresceu ouvindo a avó contar que o coração da  sua mãezinha não agüentou de tanta felicidade,  quando a  pegou  no colo pela primeira vez.
Amor do pai, não recebeu.  Ainda bem pequena  percebeu que ele a culpava pela morte da mulher que amava. Tornou-se amargo e distante não só da menina, mas de todos.  Passou a beber e dormir fora de casa. Algum tempo depois conheceu  uma mulher e não demorou muito, mudou-se  com ela, para sua  cidade,   deixando-a com a avó.  Apareceu duas ou três vezes no seu aniversário e depois parece que a esqueceu. 
No início ainda sentiu a  sua falta. Lembrava dos poucos  momentos em que ele a tratara de um modo carinhoso e  olhando  seus olhos dizia que ela era bonita como sua mãe.  Gostava de recordar esses poucos instantes em que sentia que pai a amava. Agora, já adulta, tentava compreender suas razões.
Da mãe, apenas algumas fotos que mostram a imagem de uma  mulher bonita com um  sorriso muito doce.
Diante da avó, procurava   esconder a  tristeza que sentia pela falta dos pais..  Ela se dedicou tanto, era tão amorosa... Por isso sempre fingia ser muito  feliz, fingia uma alegria que não era real.
 - Não gosto  de pensar nisso!
 Passa as mãos no rosto como se quisesse afastar as lembranças A avó foi a única pessoa significativa na sua vida,  até há dois anos atrás quando também a deixou. Ainda  agora,   sente falta do seu colo, de chegar em casa e encontrá-la esperando por ela,  da  sua voz reclamando que não estava se alimentando bem .... como ficou vazia a sua vida.
Seu coração começou a bater mais forte.  Tão distraída com seus  pensamentos,  nem  percebeu que chegou ao destino.
Parou o carro no mesmo lugar, junto a tantos outros que está acostumada a ver estacionados ali mesmo. Seguiu  pelo mesmo caminho que já se acostumou a percorrer. Caminha devagar tentando disfarçar a ansiedade.  Será ansiedade mesmo ou curiosidade?   Logo, logo vai saber se ele está lá, à espera dela.
- Clara, pelo amor de Deus, acalme-se. Calma!  Repete a si mesma várias vezes enquanto se aproxima da clareira onde o encontrou na semana anterior. 
Mas o coração não obedece e continua num ritmo acelerado.
- Imagina  se fosse a um encontro amoroso, como seria? Que é isso, menina? – continuava repetindo tentando acalmar-se.
Finalmente estava chegando...já podia ver a araucária e o tronco que lhe servia de banco.  Mas não havia ninguém......
-          Talvez seja cedo... ainda não chegou!
Continuou caminhando por ali  mesmo, não queria se afastar muito.   - Se ele vier mesmo, vou estar por perto,  mas não posso deixar  que
ele pense  que vim para encontrá-lo.  Realmente ele parece saber muitas coisas interessantes, mas sei lá!  É, isso mesmo. Nem conheço essa criatura...  Bem, se vier,  vou perguntar-lhe  alguma coisa sobre minha vida, só para saber se tem mesmo  algum poder  desses que dizem ocultos...
            Assim estava a cabeça de Clara.  Completamente confusa, sem saber direito o que querer.
            O tempo passou, os minutos pareciam horas e nada, ninguém apareceu.
- Onde andará esse velho? Ora, teria esquecido de mim?
Um misto  de  tristeza e decepção foi  tomando conta dela. Uma sensação muito desagradável.
Foi ficando cansada de esperar e  resolveu andar mais , ir até mais adiante.
- Vou  seguir pela trilha que leva até a gruta. Quem sabe o encontro pelo caminho?
            Caminhou  um bom tempo e nem sinal do velho e nem da gruta.    
Resolveu voltar dali mesmo.
- Também não vou procurá-lo! Pode parecer que estou muito interessada e isso nem é verdade. Melhor ir para casa.  Quero aproveitar o domingo para dar uma organizada nos livros e nas gavetas.
Voltou chateada.  Na verdade, mesmo não querendo admitir, gostaria de ter encontrar o velho.
- Que pena, foi tão bom conversar com ele. Pensei que tinha encontrado um novo amigo. E ele me olhou de um jeito tão carinhoso.... Por que não apareceu?  E se tiver adoecido?  Bem, no próximo domingo vou saber o que aconteceu. Ele deve ir.

Logo que chegou ligou para  Lúcia.  Precisava lhe contar o que ele não apareceu. Com certeza ela estava preocupada.  O telefone tocou várias vezes mas ninguém atendeu.  Provavelmente estava na reunião com os amigos.  Tentou ouras vezes, nada. Precisava falar com ela. Estava tão decepcionada... Sorte ter programado arrumar seus papéis, assim se distraiu  e o tempo passou  sem perceber.
Já era  noite e ainda não encontrara amiga.  Por volta das  sete horas resolveu parar o que estava fazendo e  tomar um banho.  Precisava  descansar.
Mal terminou de se arrumar, a campainha tocou. Era Lúcia que chegava acompanhada de um homem.
-          Desculpe vir sem avisar. -  foi falando a amiga enquanto entrava.
- Este é João Carlos, um amigo. Saímos para almoçar, ficamos conversando e quando dei conta já era tarde. Mas queria muito que o conhecesse.
Sorriu com seu jeito maroto e continuou:
- Vai gostar dele.  Nos conhecemos há algum tempo.... desde que passei a freqüentar o grupo.
Clara estava um tanto sem graça. Queria estar com a amiga, mas sozinha, para conversar sobre o assunto que a incomodava.  Além disso, não gostava de receber pessoas que não conhecia.  Ainda mais a essa hora da noite! Tentando parecer gentil, sorriu para o amigo de Lúcia e com um gesto convidou-o a sentar no sofá diante dele. Beijou carinhosamente a amiga enquanto sussurrava nos seus ouvidos que “ele” não apareceu.
-          Por favor fiquem à vontade....

O rapaz parecia ser bem simpático.  Aparentava ter trinta e cinco, no máximo quarenta anos.   Clara percebeu seu olhar discreto enquanto sentava.
-  É muito agradável a sua casa. Tem muito bom gosto.
Em resposta, recebeu apenas um sorriso de Clara.
- E o mais importante.  Sente-se aqui uma energia  boa.... – disse com um sorriso afetuoso, como se    fossem velhos amigos.
Clara  não falou nada, apenas sorriu.   O rapaz tinha um olhar franco, direto, e os olhos....bem os olhos eram de  mistura de cor de mel com um tom de verde bem longe.  Clara não sabia se estava mais impressionada com a cor dos olhos ou com o modo de olhar, assim, tão  direto, como se nunca tivesse nada a temer.
-  Bem, falou meio sem jeito, não entendo muito desses assuntos de energia.... Agora há pouco tempo é que comecei a ler algumas coisas. Não é, Lúcia? – olhou para amiga como se lhe pedisse ajuda para manter a conversa.
- Realmente, como  lhe disse enquanto vinha-mos para cá, a Clara está dando agora os primeiros passos nos assuntos do misticismo.  Emprestei-lhe  alguns livros e revistas, mas faz pouco tempo. Ainda não está acostumada    com alguns termos usados por nós.  Mas é questão de tempo.
Falava  sorrindo, enquanto olhava carinhosamente a amiga.
- Parece que são muito amigas...Dá para sentir uma energia de harmonia fluindo  entre vocês. É muito bom perceber esse tipo de  sentimento entre as pessoas.  Infelizmente hoje em dia vemos mais  competição  do que amizade e esta energia de ternura e cumplicidade que passa entre vocês.
-          Nós somo amigas há muito tempo...disse Clara.
- Desde  o segundo grau, completou Lúcia.  E nunca mais nos separamos. Cada uma seguiu sua vida, fez a sua Faculdade,  mas sempre nos falando,  nos encontrando em algum lugar...
 Clara sorria enquanto ouvia a amiga. Lembrava do tempo em que eram jovens e sonhavam  ainda com o príncipe encantado.
- Bem, ficamos um tempinho  afastadas quando comecei a trabalhar. Era duro trabalhar de dia e fazer plantão à noite. Quando tinha um tempinho livre era para descansar, nem pensar em sair.
-          Clara sempre levou tudo muito a sério. Chega a exagerar.
- Não concordo.  Não mesmo. Acho que sou responsável na medida certa..  É obrigação de qualquer profissional levar o trabalho que faz a sério.  Principalmente os profissionais da saúde.
- Concordo plenamente com você.. -  falou João Carlos, sorrindo. Infelizmente muitas pessoas se relacionam com o trabalho como se fosse um peso e não uma oportunidade de crescimento, como é na realidade.
A conversa foi se tornando mais agradável e fluindo por vários assuntos.  Dentro de algum tempo Clara estava relaxada, rindo  e demonstrando satisfação com as visitas.
- Clara, trouxe alguns biscoitos, torradas e geléia. Imaginei que você  faria questão de  nos convidar para lanchar...
- Já sei.... pensou que não tinha nada de gostoso nesta casa. Acertei?
Todos riram mostrando se sentir muito bem com o encontro.
- Foi uma ótima idéia! Não tinha mesmo nada especial para receber vocês. Tenho peito de frango, presunto e manteiga, serve? – falou rindo.
- Foi o que imaginei. Por isso já passei pela padaria antes de vir. Você sabe... faz muito tempo que  parei de comer carne. Claro que você não tem que se preocupar com isso, tem seus próprios hábitos alimentares.  Ah!  Trouxe também um chá delicioso. Vocês vão gostar.

Quando a anfitriã se  levantou do sofá em frente à amiga,  Lúcia riu e disse:
- Não,  por favor, deixe-me preparar tudo.  Fiquem aqui conversando,  vou para a cozinha preparar o chá. Ou preferem refrigerante? 
-          Chá está ótimo, respondeu o amigo.
-          Para mim também, falou sorrindo Clara.
-  Vocês são muito amigas....nota-se o carinho que existe entre vocês.
- É verdade.  Lúcia é uma pessoa muito generosa, muito  leal.  Merece  toda a confiança.   É um privilégio poder contar com a sua amizade. Em momentos muito difíceis, sua presença foi como um bálsamo.  Nos últimos tempos, principalmente, ela tem demonstrado tanta maturidade...tem sempre a palavra certa, na hora certa. Em algumas ocasiões, é preciso ouvir alguém que não esteja diretamente envolvido na situação, que possa pensar com isenção de emoção....e Lúcia está sempre por perto.  É a pessoa em que mais confio, desde que perdi minha avó.
João Carlos dirige o olhar para as fotos sobre o aparador que está numa das paredes e pergunta:
-          Aquela senhora das fotos?
- É, respondeu enquanto seu sorriso se apagava e o seu semblante ficava  pesado.
 - Parece que lembrar da sua avó deixa você triste. É lamentável que lembrar de alguém querido que partiu  faça você mostrar tanta tristeza. Tenho certeza que  ela não gostaria que isso acontecesse. Todos temos algumas perdas pela vida a fora. Dessa realidade ninguém escapa, infelizmente.  Mas gosto de lembrar de quem partiu com carinho, sem dor. É como uma homenagem a meus entes queridos que já foram.  Pense bem: se as fotos dela trazem dor, não seria melhor guardá-las.? Tenho certeza que você teve momentos muito agradáveis, alguns mesmo, maravilhosos,  com   sua avó.  Lembra-se de algum desses  instantes?
- Ah! Lembro de quando ia me pegar na escola. Adorava vê-la na porta me esperando.
- Veja!. Fica tão mais bonita quando sorri! Deveria sorrir mais, tem um sorriso encantador.  É assim que deve ser.  Quando lembrar de uma pessoa querida,  que por qualquer motivo não está mais presente, sorria. Lembre dela com prazer. Guarde a imagem de sua avó querida   no coração. Além disso, o amor cria um vínculo que não se desfaz com o tempo. Quem sabe um dia se reencontram?
 Olhou bem nos olhos de Clara e continuou:
- Quer saber o que faço com as fotos das pessoas que já foram?  Guardo-as numa gaveta, numa caixa...num lugar legal onde  possa  pegá-las quando quiser, quando sentir vontade, quando desejar lembrar.  É diferente de vê-las a todo momento que passo pela  sala. Veja você:  Pense naqueles dias que está cansada, triste....ao ver as fotos, a tristeza aumenta.  Estou certo?
- É verdade....responde Clara enquanto parece refletir sobre as palavras do novo amigo.
-          Então!  Sua avó não gostaria que ficasse triste ao lembrar dela.

Ficaram em silêncio até a chegada de  Lúcia com a bandeja do chá. Chegou sorrindo, como sempre.
-  Parece que a conversa estava bem interessante, sobre o que conversavam?
- O seu amigo me falava que não devo ficar olhando as fotos da vovó a toda hora.  Que deveria guardá-las.
- Claro! Ele está certíssimo. Quantas vezes já falei a mesma coisa? O  amor e a saudade que tem por ela deve ficar guardadinhos no coração. De nada adianta ficar olhando as fotos a toda hora e se alimentando de dor, de tristeza, de saudade. Se eu fosse você ouvia o conselho do meu amigo. Olha! Ele sabe das coisas.  Mas vamos ou não vamos tomar o chá? Está esfriando.
-          Talvez vocês tenham razão. Vou pensar a respeito.  
-          Então vamos ao chá? Está exalando um aroma delicioso.

 - Gostei  que tivessem vindo. Pena que chegaram tão tarde....
-  Havia pensado em almoçar com você, amiga! Mas a reunião de hoje terminou um pouco mais tarde, e não deu. O assunto que  estamos estudando é tão envolvente... e não sei  praticamente nada sobre ele. Até já ouvi falar a respeito, mas apenas  superficialmente.  Já o  João...Bem, ele sabe bem, tem muita experiência, e aí, você sabe como sou...colei nele para tirar minhas dúvidas.
- Convidei sua amiga para almoçar enquanto falávamos e quando vimos já era quase noite. – terminou João Carlos.
-          E sobre o que falavam, posso saber?
Lúcia olhou interrogativamente para o amigo, sem nada responder.
 - João Carlos olhou fixamente para Clara e durante alguns segundos nada respondeu.  Parecia distante. Talvez pensando na  resposta a dar.
-          Naturalmente.  – Falou finalmente. – Sobre o Tarô!
-          Tarô?  Como assim?
- Exatamente.  O Tarô é um dos instrumentos mais eficazes para o  auto-conhecimento. Assim como a Astrologia e tantos outros. Nosso  objetivo é adquirir o máximo de conhecimentos para acelerar a evolução  resgatar o Saber oculto e esquecido no tempo.  O Tarô é um ótimo caminho  para isso. Estamos iniciando o estudo pelos Arcanos Maiores, que são apenas vinte e dois. Mais tarde veremos os Menores, que são outra etapa do aprendizado. É um assunto muito interessante mas bastante  complexo.  Requer muito estudo para ser bem compreendido.
- Pensei que o Tarô fosse aquele baralho de cartas que algumas pessoas usam para fazer previsão dos acontecimentos futuros, as cartomantes.
Lúcia e João Carlos sorriram enquanto a olhavam carinhosamente.
-          Absolutamente. - Respondeu o novo amigo de Clara.
            - Muitas pessoas leigas no assunto confundem o Tarô com o jogo de cartas, mas um nada tem a ver com o outro. As cartomantes em geral, usam baralhos comuns para fazer as suas previsões.  Já o  Tarô,  são cartas, ou melhor dizendo,  lâminas com figuras que têm significados específicos. 
            - E como descobriram isso? De onde surgiu esse conhecimento?  Pode dizer ou é algum ensinamento secreto?
 Agora quem a olha é a amiga Lúcia. Clara fica sem jeito com esse olhar. E fica se perguntando se teria feito alguma pergunta indiscreta.
- Sinta-se à   vontade, caso não queira ou possa responder.    Sei que muitas informações são restritas aos estudantes.  Lúcia se esquiva a responder a algumas perguntas que lhe faço, alegando isso. Não é assim, Lúcia?
- Não, não se preocupe.  Fique certa que responderei a todas as perguntas que possam ser respondidas, com o maior prazer.  Afinal se pergunta é porque quer saber. E isso é ótimo. Se você, que é uma pessoa séria, se interessa por estes assuntos, vou responder-lhe sempre que for possível. Caso contrário, peço que me desculpe.
Tomou mais um pouco do saboroso chá e sorrindo continuou.
- Conta a  Tradição, os Sacerdotes antigos, que  diga-se de passagem, detinham todo o Saber acumulado através dos tempos,  ao prever a queda das civilizações, resolveram ocultar todos os seus conhecimentos sob a forma de um baralho de cartas.  Usaram essa  estratégia para salvaguardar os mistérios ocultos. Desenharam figuras e símbolos que aparentemente nada significavam, mas representavam muitos conhecimentos
Parou por um momento, observando a fisionomia das amigas que prestavam atenção ao que ele dizia e continuou: 
 -  Eles acreditaram que os homens, habituados a encontrar  no  jogo uma fonte de prazer, haveriam de preservar o baralho de cartas. Estavam certos.  Assim, ele foi passando de mãos em mãos, através do tempo, por muitos lugares, até chegar à Europa, de onde se propagou o conhecimento do Tarô. Para que tenham uma idéia, posso dizer-lhes que alguns livros e baralhos de Tarô remontam ao século XV.  De outra maneira. Não teriam chegado até nós.
As duas mulheres ouviam o relato com olhar de surpresa e interesse. Estavam impressionadas com o que ouviam.  Pensavam na dificuldade que o homem sempre teve que enfrentar para conseguir vencer os limites que lhe eram impostos pelos que detinham o Poder.
Sabe-se que muitas obras  de ocultismo foram queimadas para evitar que os conhecimentos se propagassem.  Durante séculos, as autoridades religiosas mandaram destruir os livros sagrados, para  impedir que a humanidade tivesse acesso ao Saber e ficasse presa aos grilhões da ignorância.  Não fosse pelas cartas do Tarô, os Mistérios ocultos teriam se perdido  no tempo.
-          Posso fazer mais uma pergunta? Só mais uma, juro!  
O rapaz sorriu diante do pedido de Clara. Com o olhar fez sinal para que perguntasse.
-          E Arcanos, o que significam?
            - É um  termo que significa Mistérios ou  Segredos. Seu conhecimento  desencadeia, por  uma série de associações de idéias, alcançar o verdadeiro  significado de  toda a Tradição esotérica. Os Arcanos falam das verdades da alma, da Força vital,  do Saber Universal, das Leis Divinas, dos acontecimentos cósmicos... enfim, conhecer o Tarô, é conhecer a história do Homem  e do Universo.
-  Bem, não é por acaso que  se invertermos a posição das letras, Tarô,  vira Rota, caminho.  – completa Lúcia
- O caminho da Tradição Sagrada,  complementou João Carlos.
Agora é Lúcia quem prossegue comentando:
- É um assunto  muito bonito se estudado profundamente.  Infelizmente, algumas pessoas usam o Tarô, apenas para fazer previsões ou  adivinhações, como  dizem.
- Mas o Tarô também se presta para essa finalidade, não é João? – perguntou Clara.
- Com certeza! É um excelente  instrumento nas mãos de alguns Tarólogos, outros, porém, “jogam” para satisfazer a própria curiosidade e de quem os procura.  Os  verdadeiros estudiosos, “lêem” o Tarô.  Estes poucos já sabem que o Tarô é um livro que contém sabedoria antiga. Como vê,  pode tanto servir de  instrumento  divinatório  como ser mais um caminho de auto-conhecimento.
- Nossa, como é lindo! - Clara estava encantada com o que ouvia. Nunca podia pensar que esses assuntos esotéricos fossem tão envolventes.  Sempre pensei que fossem chatos e cansativos, mas que nada....Estou impressionada, juro que estou!
-   Mas Clara, quantas vezes disse que é muito bonito?
- Desculpe, Lúcia, você tem razão. Mas agora vejo que perdi a oportunidade de aprender  muitas coisas bem interessantes. 
- Sabe o que é? – falou olhando diretamente para João Carlos – Pensei que se tratava de reuniões espíritas, e isso me assusta um pouco.
- Compreendo. A falta de conhecimentos faz com que algumas questões fundamentais para a evolução do homem, ganhem uma má reputação.  Mas nunca é tarde para  descobrir que estamos errados.  O problema é que a rigidez de pensamentos impede as pessoas de aceitar o óbvio.
- Mas sempre é tempo de  recomeçar por  outro caminho. Felizmente temos escolhas. É só querer.  Você pode a qualquer momento recuperar o tempo perdido.
- Clara, comentei com João que  você se interessou em conhecer o nosso grupo.
-          É mesmo?  E aí, o que você acha, João? É possível?
João olhou as  duas e  respondeu com um jeito muito sério:
- Aconselho você a refletir um pouco mais a respeito  Uma decisão desse tipo precisa ser bem pensada. Se ainda  não têm total convicção de que é isso que quer, talvez seja melhor aguardar mais um pouco antes de propor a sua entrada no grupo. O caminho esotérico é muito sério e de grande  aprendizado, pode levar você a querer  mudar toda a sua vida.  É melhor ir devagar, pensar bem, desse modo, não corre o risco de  começar e mais adiante, já em plena caminhada,  chegar à conclusão que não quer continuar.  Algumas pessoas até fazem isso. Mas  uma vez  lançada a semente, esta nunca mais pode ser recolhida.  Ao se afastar do caminho da busca, essas pessoas ficam com uma desagradável sensação de haver perdido algo importante.
João Carlos  falava, olhando fixamente a fisionomia de Clara. Fez silêncio como se  quisesse   avaliar o efeito de suas palavras sobre ela. Depois continuou, dessa vez se dirigindo às duas:
- Já está tarde, mas se desejar, podemos conversar mais sobre o assunto. Que tal marcar um novo encontro? Talvez  no próximo sábado, aqui mesmo ou na casa de Lúcia, como acharem melhor. Falaremos mais sobre o que estudamos no grupo, o que fazemos lá... .  Então você talvez já possa decidir alguma coisa, mas com condições de escolher, não às cegas. Bem...  É a minha proposta. E então, o que pensam? 

Já passava de meia noite. A conversa foi tão interessante, que não perceberam as horas passarem.  Despediram-se  como se fossem velhos amigos. Já na porta, Lúcia  abraçou a amiga avisando que ligaria no dia seguinte.
Clara, guardou a bandeja com as xícaras, o  que restou do lanche e se preparou para deitar-se.  Estava se sentindo muito bem. Gostou de conhecer aquele homem. Bonito e interessante.....
MCCA
continua... 

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